quarta-feira, 25 de abril de 2012

Jovens Adultos e o Limbo Imobiliário


Mavis Gary, a personagem principal de Jovens Adultos (novo filme do Jason Reitman), nasceu no interior do estado de Minnesota, mas resolveu ser frustrada na cidade grande. Basicamente é o que muita gente que nasce no subúrbio ou na roça faz. Com a ideia fixa de que o mundo é muito mais que aquela avenida e suas quatro transversais, a pessoa resolve fazer as malas e sair da casa dos pais em busca de uma vida realmente excitante. Mas olha! Se você não é excitante, independente do endereço, sua vida vai continuar uma bosta.

O filme é abusadamente contemporâneo, cheio de Coca-Colas, Pizzas Huts e KFCs espalhados pelo cenário, tem um ritmo delicioso e um bom uso da trilha sonora (como é de se esperar num filme do Jason Reitman), mas sua maior qualidade é mesmo o trabalho de Charlize Theron, que aqui faz uma personagem ora incrível, ora patética (com predominância desse último). O problema é que ver Mavis Gary sendo ridícula e tomar consciência disso foi como me olhar num espelho mal educado. E acaba que vivemos, enquanto assistimos ao filme, algo que a própria personagem irá viver logo mais na tela: uma súbita revelação dos nossos próprios defeitos.

Mavis decide voltar pra sua cidade natal porque sua vida de ghostwriter de série infanto-juvenil fracassada não anda muito boa, mas na primeira visita à casa dos seus pais, rola toda aquela incompatibilidade característica de quem já não tem nada a ver. E isso é tão comum... Eu saí da casa dos meus há menos de um ano (quer dizer, eles saíram da nossa cidade) e às vezes me pego morrendo de vontade de voltar. O que é uma grande ilusão, porque quando a gente tá longe, as lembranças são todas maravilhosas, envolvendo cafunés e pizzas na frente da TV. Ninguém lembra das encheções de saco características de qualquer dinâmica familiar. Aposto que, se eu realmente voltasse, não conseguiria ficar confortável por mais de uma semana.


Uma amiga minha, que alugou seu próprio apartamento a pouco tempo, disse também estar no limbo da vida adulta. Isso de não pertencer à casa dos pais, mas também não pertencer a lugar nenhum. Dia desses ela afirmou ter sido empurrada pela sua porta enquanto tentava entrar em casa.

Acho que todo mundo tem uma Minnesota. É aquela cidade do interior onde você cresceu, confortável e protegido, mas que hoje em dia não te acolhe mais. E o problema não tá em Minnesota. Claro que não. O problema está em mim, na Mavis Gary e na minha amiga empurrada pela própria porta. Somos nós que acabamos nos tornando diferentes demais pra poder voltar.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Um Guerreiro Amolecido

Em A República, Sócrates defende uma educação baseada na música e na ginástica. Ele prega o equilíbrio entre essas duas coisas como a única solução para uma disposição de espírito adequada. Sócrates é um mala que, basicamente, contradiz tudo e todos com o único objetivo de não chegar a conclusão alguma, mas nesse ponto ele foi feliz.

"Os que praticam exclusivamente a ginástica acabam por ficar mais grosseiros do que convém, e os que se dedicam apenas à música tornam-se mais moles do que lhes ficaria bem".

Tomando a música como o amor pela arte e as coisas da mente e a ginástica como o amor pelo esporte e as coisas do corpo, acho mesmo que minha educação não foi muito equilibrada. Primeiro que o único esporte que eu já pratiquei na vida foi natação (inclusive eu poderia me gabar das minhas medalhas aqui, mas não vou fazer isso, visto que são todas de bronze) e segundo que meu corpo tem estado cada vez mais debilitado, de um jeito que eu ficaria extremamente feliz se conseguisse chegar aos 30.

Comecei a pensar nisso, porque faz umas duas semanas que eu tô doente. Começou com uma dor de garganta e evoluiu para uma infecção no ouvido também conhecida como A Pior Dor do Universo, com direito a eu chorando no pronto socorro do hospital "meu tímpano está furado", etc. E tem sido assim, sabe? Meu corpo não aguenta um vento um pouco mais forte. Qualquer coisa me derruba.

E isso Sócrates explica muito bem. Se, por um lado, aquele que não valoriza a música "torna-se débil, surdo e cego, em vista de não ser despertado nem acalentado nem purificado no acervo das suas sensações", aquele que se deixa levar por ela corre um risco ainda maior (que é mais ou menos o que Nick Hornby disse em Alta Fidelidade):

"Se uma pessoa permitir à música que o encante com os seus sons e que lhe derrame na alma, através dos ouvidos, como de um funil, as harmonias doces, moles e lentosas a que há pouco nos referíamos, e se passar a vida inteira a trautear canções de coração jubiloso - uma pessoa assim, primeiro que tudo, se tinha alguma irascibilidade, amoleceu como quem amolece o ferro, e, de inútil e duro, o torna proveitoso; porém, se perseverou nessa atitude, e não a deixar, mas ficar fascinado, em breve funde e se dissolve, até aniquilar o seu espírito e ser arrancado da alma por excisão, com um nervo, fazendo dele um amolecido guerreiro".

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Somebody That I Used To Copy

Tem essa música, Somebody That I Used To Know, que eu só conheci mesmo porque a Ingrid Michaelson resolveu gravar. Ela, compositora e dona de cinco álbuns, estava fazendo um cover. E assim... Achei um pitel (tanto a música quanto a versão) e até pensei em procurar a gravação original da banda Gotye qualquer dia desses. O tempo passou e minha prima Luíza surgiu com um segundo vídeo da mesma música pra me mostrar. Desta vez ela era gravada por um grupo que só usava a voz, com muito mais vigor e drama que a Sra. Michaelson. A essa altura, eu já estava bastante intrigado pela provável massacrante popularidade da música no universo indie, mas a coisa ficou um pouco pior ontem, quando meu pai mandou um e-mail com o vídeo de um outro grupo igualmente sensacional cantando a mesma Somebody That I Used To Know.

Os três vídeos são bem diferentes e lindos a sua maneira. E achei importante compartilhar porque é sempre bacana conhecer várias versões da mesma música (se a música for boa, é claro) e perceber como a percepção musical de cada artista muda e como as interpretações sugerem os mais variados tipos de sentimento e reação. E porque a letra é um tanto peculiar, conta a história de um casal separado e transborda rancor.

A versão original eu ainda não vi. E nem importa.

Ingrid Michaelson, que toca todos os instrumentos, tem a unha pintada de dourado e é uma das cantoras mais queridas e completas que já vi.


Pentatonix, que fazem absurdos com a voz, têm uma harmonia incrível e uma ferocidade que faz a câmera tremer.


Walk off The Art, que colocaram todas as mãos no mesmo violão e conseguiram um resultado incrível. Destaque para a loirinha blasé que passa metade da música de olhos fechados.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Malabarismo no Semáforo

Tá péssimo. Chego aqui já por volta da meia-noite, cheio de sono, preocupação e desespero e qualquer promessa de texto minimamente razoável simplesmente evapora. E tem sido cada vez mais cansativo lidar com minha desorganização. Nunca foi fácil, é verdade, mas tenho atingido níveis inimagináveis de caos. Sinto que viver minha vida é como fazer malabarismo no semáforo. Tem sempre uma bola caindo e você precisa jogá-la pra cima a tempo de pegar a seguinte e jogá-la pra cima de novo, porque logo ali vem mais uma e esse esforço eterno e infinito.

Procrastinação é uma falha de caráter, eu acho. Não tem muito o que fazer. Ou você adota um estilo de vida zen e decide não se preocupar ou sua vida vai ser isso aí mesmo: um eterno malabares. E não vou dizer que é fácil. Quem vive de esmola em semáforo sabe como é punk ter que ficar ali na frente jogando as bolas pra cima pra, na maioria das vezes, nem ter o esforço reconhecido. As esmolas são pequenas. O pessoal tem andando de vidro fechado...

E hoje percebi que não estou só fazendo malabares. Estou fazendo malabares em cima de um monociclo (esse monociclo aí eu vou deixar pra capacidade metafórica de cada um traduzir). E que nunca foi tão fácil perder o equilíbrio e estragar o show.

Prevejo as bolas rolando no chão, eu caído no asfalto e nenhuma esmola.