domingo, 24 de fevereiro de 2013

Top 9 - Filmes do Oscar 2013


Talvez essa seja a pior seleção da história do Oscar. Eu, particularmente, não lembro de um ano com a mesma quantidade de filme medíocre. Tanto que só hoje à tarde consegui terminar de ver os indicados à categoria principal. E como já é tradicional por aqui (um blog inteiro baseado em tradição, percebam), publico agora meu ranking pessoal dos filmes do Oscar 2013.



É uma história boboca de recuperação e vitória. Mas é uma história boboca de recuperação e vitória com roteiro bem feito, trilha sonora cativante e excelentes atuações de Bradley Cooper, Robert De Niro e Jennifer Lawrence (favorita ao Oscar de melhor atriz). É o Pequena Miss Sunshine do ano. O filme descolado e sapeca que todos tentam amar (e, nesse caso, não conseguem).



Acho que a Kathryn Bigelow pesou a mão dessa vez. A Hora Mais Escura é um filme arrastado que, salvo uma ou outra cena, desperdiça grandes oportunidades de criar tensão e desenvolver o personagem principal. Não gosto de filme que se nega a entregar pro público momentos de catarse e não oferece nada pra suprir essa falta.



O que Quvenzhané Wallis, de seis anos de idade, faz aqui é monstruoso. Ela carrega o filme nas costas, consegue emocionar e trazer a plateia pra ela. Infelizmente, o roteiro do filme não corresponde ao talento de Wallis, e se contenta em repetir a fórmula de outros tantos exemplos do cinema independente norte-americano.



Lincoln tem seus problemas (é excessivamente didático, exalta uma figura já exaltada à exaustão e cai no melodrama), mas também traz um Daniel Day-Lewis e uma Sally Field afiadíssimos e em perfeita harmonia (a cena do diálogo mais caloroso dos dois é uma aula de atuação). É o favorito a melhor ator (uma das poucas certezas da noite), melhor ator coadjuvante (Tommy Lee Jones e sua peruca danadíssima) e melhor diretor (Spielberg, graças à ausência de Ben Affleck entre os indicados).

5. Argo


O favorito do ano é um filme pequeno, se comparado à megalomania de outros concorrentes como Lincoln e Os Miseráveis, mas consegue coordenar seus elementos técnicos e cênicos de forma tão  eficiente que acaba criando a cena mais tensa do ano. Ben Affleck ficou de fora do prêmio de melhor diretor, mas isso não deve impedir Argo de levar na categoria principal, além de melhor roteiro adaptado e melhor montagem.



As quase três horas de cantoria de Os Miseráveis provocaram reações extremas tanto na crítica quanto no público. Comecei a ver o filme achando tudo cansativo, mas sou presa fácil pra musicais e não demorou muito até que eu começasse a chorar no cinema, enquanto balançava pra lá e pra cá no ritmo da música. Deve ganhar melhor atriz coadjuvante (Anne Hathaway emagreceu, raspou a cabeça, cantou e chorou ao vivo com esse propósito) e mixagem de som.



É um dos filmes mais divertidos do Tarantino. Tem todos os elementos cultuados pelos fãs do diretor (e eu faço questão de me incluir na categoria), tem Leonardo DiCaprio num papel sensacional (achei uma barbaridade ele não ter sido indicado esse ano), Christopher Waltz repetindo o sucesso de Bastardos Inglórios (só que agora do lado bom) e um final épico, cheio de tiro e sangue. Infelizmente, só tem chances de ganhar melhor roteiro original.

2. Amor


O filme de Michael Haneke é dessas porradas dadas com carinho. Conta a história de um casal e sua relação com a proximidade da morte e traz Emmanuelle Riva com uma interpretação absurda, que faz todo mundo ficar com o coração na mão. É cruel até não poder mais e, justamente por isso, honra completamente seu título. Favorito incontestável a melhor filme em língua estrangeira.



As Aventuras de Pi consegue falar de fé, família e morte sem parecer um filme religioso, familiar ou mórbido. Em vez disso, promove o encantamento, enche nossos olhos e nos convida a embarcar com Pi e Richard Parker numa aventura deliciosa. Não tem muitas chances nas categorias principais (embora Ang Lee ainda esteja cotado para diretor), mas é o favorito em trilha sonora original, efeitos visuais e edição de som.

PS1: Todas as imagens usadas neste post foram editadas pelo Chico Fireman e roubadas descaradamente por mim.

PS2: Amanhã (hoje?) eu estarei comentando o Oscar pelo Twitter e, obviamente, dando RT nas melhores piadas da noite. A gente começa com o tapete vermelho, umas 21h. Vem!

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Ele


Ele levantou da cama e foi escrever. E escreveu por semanas inteiras, se desligou do mundo, deixou que nascesse nele qualquer coisa de poético. E foi descoberto. E disseram que era um grande novo talento. E que sua escrita era vulgar e hermética. E imprevisível. E cheia de pontos finais desnecessários, preposições desnecessárias. Conjunções desnecessárias. Assuntos desnecessários. E tudo era lindo.

Ele aprendeu inglês.

Foi pra Nova York. E assistiu espetáculos, visitou museus, conheceu gente bonita, foi pra rehab, voltou da rehab, mudou pra Paris.

Ele aprendeu francês.

Cantou nas horas vagas. E participou de saraus plenos de música e poesia. E se embriagou de mundo. E se apaixonou por uma cortesã.

Ele finalmente aprendeu a amar. E ela morreu de tuberculose. E ele decidiu que amar não era bom. Era bem ruim, na verdade.

E teve uma recaída atrás da outra. Se isolou do mundo, escreveu um romance. Dessa vez um bom. Que fez sucesso. Que deu certo. Alcançou plateias, encantou a crítica, deixou uma mensagem e ele não viu nada disso, porque morreu de overdose. Ou se matou. Ou foi assassinado. Não ficou muito claro.

E disseram dele que era vulgar e hermético. E que teve uma vida cercada de mistérios. E que fez uma bagunça com o coração. E que não sabia amar. E que teve uma infância difícil.

Adotaram seu livro no último vestibular.

Mas não teve vestibular. Não teve livro. Não teve cortesã. Não teve Paris. Não teve francês. Não teve sarau. Não teve Nova York. O inglês não teve. Nem o escrever por semanas inteiras. Nem o levantar da cama.

PS: Tem conto novo no Crimes por Extenso. E é dos masoquistas.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Salubridade, Sanidade e Perfume


Cheguei em casa e fui recebido por uma mãe de banho tomado, cabelos úmidos e perfume de condicionador. Elizete, que trabalha na minha irmã mais velha, veio dar um salve aqui em casa e as duas passaram o dia numa faxina que, imagino eu, precisou terminar com esse ritual de autopurificação materno. Depois ela foi me mostrando os cômodos, quase efusiva. Contou que tinham passado aspirador de pó em todos os cantos do meu quarto (o pobre menino asmático) e tinham limpado até os segredos mais sujos do guarda-roupas. Entrei no banheiro e, ofendido com tamanha assepsia, fiquei pensando em como foi difícil passar tanto tempo sem ela.

Desde que voltei a morar com meus pais, nunca mais vi a louça acumular. A pia está sempre vazia, seca e brilhando. As roupas aparecem passadas, dobradas em pequenos cubos em cima da cama. As cobertas, lençóis e toalhas são trocados de pouco em pouquíssimo tempo. O papel higiênico, o sabonete, o shampoo, o condicionador... Tudo é reposto de forma discreta e silenciosa, escondendo assim o maior segredo da minha família: elfos domésticos.

Puxei da minha mãe essa obsessão com a limpeza, obviamente sem nunca alcançar seu alto nível de dedicação à higiene. Sempre gostei de ter as coisas no lugar e tenho pequenos surtos de deleite quando termino de limpar qualquer coisa mais ou menos imunda. Acho que significa o começo de algo. Como se fosse impossível ser feliz enquanto não passasse álcool gel nas mãos. Mas também tenho preguiça e foi essa minha salvação. Foi isso que me impediu de ser uma Mônica Geller de vida.

Antigamente, no banho, me ensaboava por horas e com tal zelo e tanto, que acreditava piamente ser uma questão de tempo até que meu corpo desaparecesse. Um menino que, de tanto tomar banho, sumiu. Porque uma linha muito tênue divide as células vivas das mortas. É preciso cuidado com essa mania de querer limpar tudo que é sujo. A gente sempre acaba descobrindo que nada é realmente limpo.