Estava lendo esse conto do Machado de Assis pra uma prova que, graças à greve das federais, não aconteceu; e tive espasmos de prazer com o último parágrafo. A história é desse menino, o Pilar, que perdeu uma moeda de prata, conquistada num negócio mal sucedido com Raimundo (seu colega interesseiro), por causa de um menino dedo-duro chamado Curvelo. O professor, indignado com Pilar e Raimundo, não pensou duas vezes e jogou a moeda pela janela da escola. No dia seguinte, Pilar acordou com o firme propósito de encontrá-la antes de ir pra aula:
"De manhã, acordei cedo. A idéia de ir procurar a moeda fez-me vestir depressa. O dia estava esplêndido, um dia de maio, sol magnífico, ar brando, sem contar as calças novas que minha mãe me deu, por sinal que eram amarelas. Tudo isso, e a pratinha... Saí de casa, como se fosse trepar ao trono de Jerusalém. Piquei o passo para que ninguém chegasse antes de mim à escola; ainda assim não andei tão depressa que amarrotasse as calças. Não, que elas eram bonitas! Mirava-as, fugia aos encontros, ao lixo da rua...
Na rua encontrei uma companhia do batalhão de fuzileiros, tambor à frente, rufando. Não podia ouvir isto quieto. Os soldados vinham batendo o pé rápido, igual, direita, esquerda, ao som do rufo; vinham, passaram por mim, e foram andando. Eu senti uma comichão nos pés, e tive ímpeto de ir atrás deles. Já lhes disse: o dia estava lindo, e depois o tambor... Olhei para um e outro lado; afinal, não sei como foi, entrei a marchar também ao som do rufo, creio que cantarolando alguma cousa:
Rato na casaca... Não fui à escola, acompanhei os fuzileiros, depois enfiei pela Saúde, e acabei a manhã na Praia da Gamboa. Voltei para casa com as calças enxovalhadas, sem pratinha no bolso nem ressentimento na alma. E contudo a pratinha era bonita e foram eles, Raimundo e Curvelo, que me deram o primeiro conhecimento, um da corrupção, outro da delação; mas o diabo do tambor..."
E como eu entendo o Pilar! Aceito perfeitamente que ele perca todo e qualquer propósito quando confrontado com o barulho dos tambores. E até me compadeço. Porque meus tambores têm sido cada vez mais irresistíveis. É recorrente isso de sair de casa com um objetivo claro e tempos depois dar comigo na Praia da Gamboa, maltrapilho.
Ontem meu tambor foi o Song Pop e as 30 pessoas incríveis e insones que jogam comigo. Amanhã pode ser uma série, um romance barato, o Tumblr, Google Reader, YouTube... São muitas as chances de seguir marcha na direção oposta. Porque o dia está lindo, visto calças amarelas e eles estão rufando.
2 comentários:
Gabriel, adorei!!!
:)
Tava fazendo um pesquisa sobre a Lana Del Rey por pura curiosidade, e achei seu blog. E que achado! Adorei todos os textos que li, em especial esse.. Um beijo ;)
Postar um comentário