Aproveitei que uma aluna tinha desmarcado a aula da tarde e corri pro cinema, numa tentativa inútil de acabar com a lista "Quero ver" do Filmow. Comprei logo os ingressos pra duas sessões seguidas: Contágio, com Kate Winslet e grande elenco (grande mesmo) e O Palhaço, novo filme do Selton Mello (escrito, dirigido e estrelado por ele). Todos com um preço promocional maravilhoso de segunda-feira. Fiz os preparativos pra tarde, enchendo a mochila de salgadinho e refrigerante, e me joguei nas poltronas vermelhas do Kinoplex.
O primeiro filme, o relato de uma epidemia mortífera dominando a Terra, é bem amarrado, bastante tenso e conta com muita gente boa (de modo que eu não sabia se prestava atenção na Kate Winslet, na Marion Cotillard, no Jude Law ou no casal sentado à minha frente). Mas O Palhaço, esse sim, fez minha alma deixar Brasília, deixar esse tempo, e ir parar na estrada, ao lado de uma trupe circense e mambembe dos anos 70, onde a história acontece.
Benjamim (Selton Mello) é um palhaço que trabalha com o pai (Paulo José), o dono do Circo Esperança e também palhaço. Cansado, depressivo e sem a menor certeza de que é essa vida que ele quer, Benjamim passa a se arrastar nas apresentações e a causar estranheza fora de cena. Perdeu a graça. E em certo momento da projeção, o pai de Benjamim diz pro filho algo como: "A gente tem que fazer o que sabe fazer. O gato bebe leite, o rato come queijo e eu sou palhaço. E você?".
Benjamim não sabe responder. Não sabe o que é. Ele não tem identidade. Sério... A identidade mesmo, de papel... Ele não tem. Tem só uma certidão de nascimento um tanto amassada que não lhe vale nem pra comprar um ventilador. Então ele decide correr atrás da sua identidade. E aí eu já não tô mais falando de papel.
Só sei que minha namorada chorou no final, porque o filme é mesmo bastante bonito e sincero. Tem um ambiente muito melancólico, um povo muito sofrido, mas um povo que sabe sorrir. Sei lá... Circo é uma coisa meio depressiva. Um monte de gente pagando por um pouquinho de felicidade e outros tantos recebendo pela mesma coisa. E comercializar felicidade pode mesmo ser um pouco confuso. A gente acaba sem saber se é feliz porque pagou ou porque tá sendo pago.
Voltando pra casa, abri minha mochila e tirei umas latas de Pringles já pela metade, um biscoito de chocolate mais caro que gostoso, os ingressos usados do cinema, algumas revistas e um livro que estou lendo há sei lá quantos meses. E fiquei confortável, vendo aqueles símbolos. Fiquei confortável com a ideia de que, bem ou mal, isso sou eu.