E se você pudesse escolher apenas um dia do ano, por exemplo, 15 de julho, e contar o que acontece nele ao longo de 20 anos da sua vida? Essa é a proposta de Um Dia, novo romance do britânico David Nicholls e atual queridinho das rodas de leitura (como se alguém participasse de roda de leitura nos dias de hoje, mas tudo bem). Lançado aqui no Brasil pela Editora Intrínseca (que nunca deve ter ganhado tanto dinheiro), o livro conta a história de amor e amizade entre Dexter e Emma. Dois jovens que se conheceram no dia de sua formatura e nunca mais conseguiram se separar, embora quase nunca estivessem realmente juntos.
Achei o formato brilhante, embora a ideia não seja original. Em 2009 os hipsters de todo o mundo se cortaram por 500 Dias com Ela, comédia romântica que mostrava fragmentos de uma relação amorosa, assim como faz Um Dia, mas no caso do filme, sem se preocupar com qualquer ordem cronológica (o que me fez desistir de juntar as peças do quebra-cabeça em 20 minutos). Mas esse tipo de narrativa é, de fato, muito espertalhona. Primeiro porque libera o autor de uma série de cenas importantíssimas que, naturalmente deveriam ser descritas, mas deixam de ser necessárias, já que as coisas acontecem entre um capítulo e outro. E segundo porque deixa o leitor inteiramente livre pra preencher o vazio textual com a imaginação. É como se pegassem uma página do seu diário de 2005 e outra do seu diário de 2006 e colocassem as duas lado a lado. Você sabe como era antes e como ficou depois, mas ainda precisa fabular o que houve entre uma coisa e outra.
Os dois personagens são muito bem construídos, assim como a maioria dos coadjuvantes. Dexter é um menino rico e um pouco perdido, facilmente seduzível por coisas como carro, decotes e vodka. Já Emma é uma moça inteligente e engajada, mas facilmente seduzível por coisas como Dexter. E os dois se dão perfeitamente bem juntos, mas quase nunca conseguem ficar ao lado do outro. Dexter acaba soterrado pela fama da televisão, Emma acaba desiludida pelos seus trabalhos pouco remunerados, e os dias vão passando... E a gente torce por eles o tempo inteiro, porque está claro que um não vai conseguir ser feliz sem o outro.
Romances britânicos são naturalmente deliciosos. Tome como exemplo os livros de Nick Hornby (Alta Fidelidade, Juliet, Nua e Crua), o rei da literatura contemporânea que, inclusive, classificou Um Dia como "cativante, inteligente e espirituoso". E parece que ele estava certo. O texto é realmente muito cativante e, embora de fácil digestão, incrivelmente profundo. É o tipo de história que somos acostumados a prever, mas não se engane: desta vez você vai errar todas as previsões. E, provavelmente, vai chorar.
""O que você vai fazer com sua vida?" De uma forma ou de outra, parecia que as pessoas estavam sempre fazendo aquela pergunta - os professores, os pais, os amigos às três da manhã -, mas a questão nunca tinha sido tão premente, e ela estava longe de obter uma resposta. O futuro se estendia à sua frente, uma sucessão de dias vazios, cada um mais desanimador e incompreensível que o outro. Como iria preencher todos eles?"
PS: O livro vai virar filme, estrelado por Anne Hathaway e Jim Sturgges, com estreia prevista para novembro no Brasil.